A “guerra de terrenos”, nos últimos dias, está a tomar contornos verdadeiramente dramáticos. A situação precisa de ser contida rapidamente por quem de direito, porque tende em descambar para uma tragédia, sobretudo no município de Cacuaco, distrito urbano do Sequele, em militares, alegadamente do corpo de Comandos, invadiram terrenos de camponeses no bairro Vila Verde Cativa.
Márcia Elizabeth
A situação já vem de longos anos, principalmente na província de Luanda, onde continua a prática de usurpação e ocupação ilegal de terrenos infra-estruturados ou não, em particular em reservas fundiárias do Estado.
Tal prática tem envolvido, desde cidadãos comuns, funcionários públicos, fiscais, elementos ligados à polícia e às Forças Armadas, até oficiais superiores e altos dirigentes, entre outros.
Pelo que se tem apurado ao longo de longos anos, a ocupação de terrenos de forma ilegal e muitas vezes de forma criminosa, com mortes a mistura, tem sido um “negócio” bastante lucrativo.
Outrora, a província de Luanda, para além da cidade capital e seus bairros, era rodeada por pequenas aldeias e áreas verdes onde se cultivavam produtos alimentares e árvores de frutos e havia quintas em que também se criavam aves e gado caprino e suíno, entre outros.
Depois da independência, com o agudizar da guerra que grassou pelo país e motivou a que muitas populações tivessem que deslocar-se das suas comunidades para as cidades, Luanda não foi excepção.
Muitos desses deslocados acabaram por ficar em Luanda, aumentando grandemente o seu índice populacional. Assim pelo aumento de moradores, novos bairros foram aparecendo, sobretudo nos locais em que anteriormente foram lavras, hortas, quintas, etc. Esses espaços pertenciam a quem os trabalhava e essas pessoas estavam legalizadas.
Contudo, o Governo, ao abrigo da Constituição, que considera a Terra como “propriedade do Estado”, definiu grande parte desses espaços como “Reservas Fundiárias” do Estado para a edificação de diversas infrastruturas sociais. Porém, em respeito aos direitos dos cidadãos, muitos camponeses, alegadamente donos de vários hectares, nesses locais, continuaram a ususfruir dos mesmos.
Diante da sua fragilidade, esses cidadãos passaram a ser vítimas de diversos invasores, desde pessoas individuais até organizações de malfeitores, que intimidam, espancam e há relatos de mortes, tudo para ficar com os terrenos que depois acabam por vender.
Assim, este tipo de crimes foi-se tornando cada vez mais aliciante, por envolver, em algumas situações, consideráveis somas monetárias, entre outros benefícios para os invasores.
Apesar da situação ocorrer em vários municípios da província de Luanda, com destaque para Cacuaco, Belas e Viana, que são, actualmente, aqueles com mais casos de ocupação desordenada e venda ilegal de terrenos nas Reservas Fundiárias do Estado, preservadas para projectos sociais, não tem poupado também os referidos camponeses.
Tal é o caso que um cidadão, cuja identificação não é revelada por razões óbvias, contou a este Jornal, nesta quarta-feira (27), depois de ter sido agredido no mesmo dia por militares, alegadamente pertencentes ao corpo de Comandos, que invadiram terrenos no bairro Vila Verde Cativa, no distrito urbano do Sequele, município de Cacuaco.
O cidadão afirma ser proprietário de um terreno naquele local e fora ver a situação que se está a viver ali.
Ele explica que as senhoras Maria Diogo, Camila Nambundo, Jorgina António, Bernice Natchoal e o senhor Paulo Domingos, entre outros, são camponeses que sempre viveram e trabalharam ali e possuiam vários hectares de terra.
Há algum tempo, começaram a ser vítimas de ameaças e usurpação dos seus espaços por indíviduos que nem respeitavam sequer o produto do seu trabalho. Assim sendo resolveram queixar-se à coordenação do bairro, liderada por Francisco Cativa (de quem ter-se-á originado o nome do bairro) e seus correligionários, Sousa da Costa, Gregório Satiama, Ambrósio e demais.
Ouvidos os camponeses, o coordenador, Francisco Cativa, disse-lhes que para conter os invasores teria que recorrer a algumas ‘forças’ para ajudar e, em compensação, para não perderem tudo, teriam que ceder algumas parcelas do vasto espaço aos mesmos.
Segundo o cidadão, foi assim que apareceram na jogada elementos dos Comandos, do Serviço de Investigação Criminal (SIC), funcionários da administração e da própria coordenação do bairro Vila Verde Cativa que, depois de supostamente terem corrido os invasores, receberam parcelas de terreno.
Infelizmente para os camponeses, a situação não acabou e só foi piorando, com os mesmos indivíduos, principalmente os militares, a apropriarem-se cada vez mais dos terrenos, que vão vendendo a outros, chegando a espancar os camponeses e quem venha em seu socorro.
Salta a vista que os mesmos foram enganados pelo dito coordenar e seus comparsas, que terão beneficiado largamente do “esquema”.
O cidadão afirma que a situação é alarmante. O bairro Vila Verde Cativa tem agora uma nova coordenação, mas os elementos da anterior coordenação continuam no terreno a intimidar as pessoas e a usurpar terrenos com os seus “amigos” militares.
O caso é do conhecimento da administração distrital do Sequele e o seu administrador, Francisco Tchipiica, estará já a tomar as devidas precauções. No mesmo sentido, os camponeses e demais cidadãos residentes no bairro Vila Verde Cativa, segundo o cidadão que prestou esta informação, elaboraram uma exposição que vai ser entregue à Polícia Judiciária Militar e ao SIC.
Continuaremos a acompanhar a situação e a informar o público.