A tese da vandalização não convence embora convenha para inibir qualquer responsabilização ao Estado ou à Sonangol, neste caso por negligência. O mesmo poço terá sido abandonado por fraca produção, mas neste momento faz parte do bloco centro que a Sonangol vendeu recentemente à empresa italiana ENI
Não sendo a primeira vez que acontecem derrames de petróleo na costa de Cabinda, poluíndo as águas e com todas as consequências negativas que isso acarreta, quem de direito, geralmente, cala-se e, se vem a público prestar qualquer esclarecimento, deve-se à pressões da sociedade e fá-lo tardiamente.
Tal é o caso do mais recente derrame que aconteceu naquela província, cuja reacção da Agência Nacional de Petróleo e Gás (NPG) só apareceu depois de uma denúncia pública da sociedade civil cabindense feita nos órgãos de comunicação social e nas redes sociais.
Só assim “o governo despertou do sono”. Sabiam da ocorrência, mas andaram a esconder porque os assuntos do petróleo em Cabinda são “segredo de Estado”, afirmam os cidadãos de Cabinda.
Em reacção à nota de imprensa da ANPG sobre o assunto, o padre Raúl Tati, proeminente figura da sociedade civil local afirma que, ao ler o texto da referida nota de imprensa, surpreendeu-lhe “desagradavelmente a explicação dada sobre as causas da ocorrência. Francamente! É inadmissível e demonstra ressaibos de subestimação da nossa inteligência afirmar com toda a certeza que o referido poço abandonado nos anos 60 estaria ‘a derramar petróleo em consequência da vandalização de que foi alvo nos últimos dias por elementos não identificados que tentaram retirar uma linha junto ao poço e por conseguinte comprometeram a integridade da linha, causando o derrame’”.
Para o prelado, esta explicação não é técnica nem é séria. “Quem são os elementos não identificados? Fantasmas ou extra-terrestres (OVNIs)?”, questiona.
Tendo em conta a responsabilidade desse organismo do Estado e as suas competências técnicas sobre a matéria, aponta, “era de esperar algum cuidado na elaboração dessa informação pública. O mais avisado seria aventar algumas hipóteses enquanto decorrem investigações sobre a ocorrência. A tese da vandalização não convence embora convenha para inibir qualquer responsabilização ao Estado ou a Sonangol, neste caso por negligência”.
O mesmo poço terá sido abandonado por fraca produção, mas neste momento faz parte do bloco centro que a Sonangol vendeu recentemente à empresa italiana ENI.
Quanto as causas do derrame, na opinião de engenheiros da área, pode-se adiantar as seguintes hipóteses:
1. A fadiga dos vedantes usados aquando do abandono.
2. A idade da tubagem e dos equipamentos de segurança (válvulas, tampões) que provavelmente tenham desenvolvido uma grande corrosão interna causando o furo e o consequente vazamento do hidrocarboneto.
São hipóteses com alta probabilidade. Mesmo que a empresa tenha desactivado o poço com as normas de segurança aplicáveis naquela altura, a sua longevidade é um factor de estrangulamento e logo passível de alguma vigilância. Hoje as tecnologias de sondagem do petróleo já não são as mesmas dos anos 60. Tudo indica que houve negligência na conservação do estado de inactividade do poço. Contra factos não há argumentos!
O que deve ser feito?
Segundo opiniões colhidas junto dos profissionais e engenheiros da área, pode-se avançar com as seguintes medidas:
1. Revisão do seu file ou histórico para saber o tipo de tratamento dado e a frequência da sua inspecção.
2. Revisão do estado da cabeça do poço e seus equipamentos de segurança ali instalados.
3. Reabertura do poço para um “survey” da sua pressão interna e outros parâmetros de corrosividade.
4. Estancamento ou selagem total desde o fundo do poço ao topo.
5. Estabelecimento de um programa de manutenção preventiva com a sua tabela de periodicidade de revisão ou inspecção.
6. Criação de uma equipa técnica para o efeito e que envolva outros poços onshore no mesmo estado.
7. Necessidade de estudos laboratoriais para se determinar o tipo de óleo, o tipo de gás, a pressão do fluxo, a sedimentação, a emulsividade, etc. É preciso descartar que seja um crude ou gás com teor de ácido sulfúrico (H2S), tendo em conta a sua perigosidade.
Essas intervenções poderão estancar imediatamente o vazamento e minimizar os riscos de um desastre ambiental na localidade.
“Infelizmente o petróleo continua a ser a desgraça dos flagelados do vento norte! Até quando?!”, questiona Raúl Tati.