O presidente da Associação Mãos Livres, Guilherme Neves, considera que, actualmente, assiste-se a interferências do poder político no sistema de justiça em Angola
Domingos Kinguari
A informação foi prestada durante uma conferência sobre o tema: “A reforma da justiça e o combate à corrupção; do discurso à prática”, em que Guilherme Neves, durante o discurso de boas-vindas, disse que ao pôr-se em causa um tão importante bem da justiça, seguidamente, cria desconforto e não credibilidade da justiça e de várias outras instituições.
Em sua opinião, em alguns sectores da nossa sociedade paira a ideia de que há interferência do poder político no sistema de justiça e é entendido como um factor impulsionador da existência de alguns casos de violação dos direitos fundamentais contidos na constituição.
Guilherme Neves referiu que é entendimento da Associação Mãos Livres «que a importância da manutenção da paz, a reforma da justiça, reforço do Estado democrático e de direito, boa governação, descentralização governativa e combate à corrupção é um compromisso que o país assumiu e deve inserir o cidadão nas acções que afectam directamente a vida de todos e cada um dos angolanos».
Desde a aprovação do novo código penal, código do processo penal e da lei sobre repatriamento coercivo de capitais, «tem-se falado muito, mas a sociedade civil pouco sabe sobre a real aplicação e sua importância na vida do cidadão. A sociedade civil constitui um actor relevante do desenvolvimento do país, pelo conhecimento próximo dos problemas das comunidades e da sua capacidade de mobilização da população», considera.
No quadro da reforma de justiça em curso e pela aprovação do novo código penal, o código do processo penal e a lei de repatriamento coercivo de capitais, esclareceu que a Associação Mãos Livres, «no âmbito do seu programa de capacitação da sociedade civil e monitoria da reforma da justiça em Angola, visa contribuir para a promoção e defesa dos direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos visando a consolidação de um Estado democrático e de direito à luz da Constituição de Angola», disse.
«Angola é um dos países que obviamente do ponto de vista da justiça ainda funciona com o sistema herdado do colono português que dista desde 1866. Conquistada a independência a 11 de Novembro de 1975, e passados que são quarenta e seis anos, Angola como um Estado soberano, apesar de algumas reformas pontuais verificadas no sistema e funcionamento da justiça, continua a ser um país dependente de alguns diplomas que deram funcionalidade do sistema colonial o qual herdou», lembra.
«Crimes terroristas ameaçam a paz»
Por sua vez, em representação do ministro da Justiça e dos Direitos Humanos, Francisco Queiroz, o seu assessor, Sebastião Rocha, assegura que «alguns diplomas legais, que no âmbito da reforma da justiça e do direito impactam para o combate à corrupção, como são os casos da lei da cooperação judiciária internacional em matéria penal, que permitiu o reforço da colaboração processual mundial em matéria penal, motivada pelas seguintes razões principais: a abolição de fronteiras e a livre circulação de pessoas, serviços e capitais, o que implica a sua crescente mobilidade entre territórios de diferentes Estados», disse.
Segundo Sebastião Rocha, «a profunda evolução tecnológica no domínio das telecomunicações em geral, para o bem e para o mal, entre os cidadãos de vários Estados, as necessidades de combate aos crimes organizados, transfronteiriços e aos crimes de terrorismo, tornou premente o reforço da cooperação judiciária internacional em matéria penal», elucidou.
Sebastião Rocha esclareceu que «a lei sobre prevenção e combate ao terrorismo, face à necessidade de dar cumprimento aos tratados e acordos internacionais de que Angola é parte, relativos à prevenção, repressão e combate ao terrorismo, afigurou-se assim necessário adaptar o ordenamento jurídico do país aos instrumentos internacionais e dar devida resposta à fenomenologia criminosa terrorista que ameaça a paz, a tranquilidade e a segurança interna e internacional».
«Sobre a lei de prevenção e combate ao branqueamento de capitais, do financiamento do terrorismo e da proliferação de armas de destruição em massa, Angola ratificou as convenções das Nações Unidas contra o tráfico ilícito de narcóticos e substâncias psicotrópicas, contra o crime organizado transnacional e sobre a supressão do financiamento do terrorismo, as quais recomendam a definição de um sistema optimizado de prevenção e combate ao branqueamento de capitais, financiamento do terrorismo e da proliferação de armas de destruição em massa em reforço da segurança nacional e da garantia do sistema financeiro angolano», mencionou.
O assessor jurídico do ministro da Justiça e dos Direitos Humanos, Sebastião Rocha, considera que «há necessidade de actualização do quadro jurídico em matéria de prevenção e combate ao branqueamento de capitais e ao financiamento do terrorismo, procedendo por um lado a optimização material e sistema da lei n.º 34/11, de 12 de Dezembro, e por outro, a conformação do regime vigente face à evolução das necessidades de prevenção e repressão, o alinhamento da política de prevenção e repressão face às recomendações e melhores práticas internacionais em 2020, foi igualmente reformulada e harmonizada às melhores práticas mundiais, a norma de prevenção e combate ao branqueamento de capitais, do financiamento do terrorismo e da proliferação de armas de destruição em massa», enfatizou.
No plano da reforma da justiça e do direito, «o novo código penal e do processo penal, aprovado em Novembro de 2020 e em vigor desde Fevereiro de 2021, consagram vários tipos legais de crimes que visam reprimir a corrupção e as práticas com elas relacionadas», garante.