O secretário-geral do Conselho Angolano de Coordenação das Autoridades Tradicionais (CACAT), Tiago Katumo, considerou em entrevista ao Jornal 24 Horas online que o antigo Presidente de Angola, José Eduardo dos Santos, e também João Lourenço, nunca se interessaram em visitar as campas de Njinga Mbandi e Ngola Kiluanji Kya Samba
Domingos Kinguari
Tiago Katumo referiu que «a rainha Njinga Mbandi faleceu às três horas do dia 17 de Dezembro de 1663, mas tem sido mais reconhecida a nível internacional que na sua própria terra; nunca o Executivo se preocupou em construir-lhe uma sepultura digna em sua homenagem, nem nunca realizou uma romagem porque os dirigentes do MPLA nunca dignificaram o trabalho desta heroína na resistência à ocupação colonial. Desafiamos este ano o Ministério da Cultura, Turismo e Ambiente em realizar alguma coisa para dignificar a imagem da rainha Njinga Mbandi e a de Ngola Kiluanji, já que para se chegar à zona onde foi sepultado não existem vias de acesso, mas não obtivemos qualquer reacção», lamenta.
Aquele responsável chama a atenção do Presidente João Lourenço e do seu partido, para que se encare de forma diferente as diversas culturas nacionais e não pactuar com separações como tem acontecido.
«Mas é altura de se olhar para os heróis da resistência à ocupação colonial de forma diferente, já se deveria ter construido uma estátua de Njinga Mbandi, de Ngola Kiluanji Kya Samba, de Nzinga Nkuvu, de Mwene Nkongo, e de tantos outros reis. A estátua de Njinga Mbandi que estava no antigo largo do Kinaxixi foi destruída para dar lugar a construção de um projecto imobiliário que retirou dinheiro público e que nunca terminou as obras», reclamou.
Falando a este jornal, Tiago Katumo disse que está preocupado com a instrumentalização dos sobas por parte do partido governante, mas «não podemos pensar de que o MPLA não vai deixar o poder, os sobas que aparecem a público a receber bujingangas para influenciar o voto a favor do MPLA, fazem isso porque são membros dos comités do partido que sustenta o Executivo, são as ditas autoridades tradicionais que foram nomeadas pelo MPLA, como é o caso concreto do soba da Estalagem, no município de Viana, identificado apenas por Malungo, que não respeita as comunidades, nem as tribos. O soba da tribo recebe orientação a partir dos seus antepassados, mas aquele não, recebe orientações a partir do partido, para desvirtuar as comunidades e conseguir tirar dividendos para poder reinar enganando o povo», alerta.
Tiago Katumo refere que os sobas que recebem dinheiro da corrupção e da traição, acabam por não se satisfazer porque valores «ficam encravados nas suas gargantas, não avança, encontra sempre um pico que aparece na sua consciência, porque sabem que estão a maltratar e enganar o povo. O soba é aquele que aglutina todos e não separa ninguém. Nas aldeias temos os gatunos, os ngobires, os quimbandeiros, os feiticeiros, mas as autoridades do poder tradicional convivem com todos e não os separa. E sempre que há problema chama-lhes a atenção, quando acontecem mortes por feitiço reúnem-se os tribunais tradicionais que têm como função dirimir os conflitos, por isso deveria também haver responsabilização dos tribunais civis para aquelas organizações partidárias que não criam políticas de desenvolvimento e aparecem a instrumentalizar o povo para que votem neles», enfatiza.
«A sina do MPLA é governar com corrupão»
Sobre a instrumentalização das autoridades tradicionais pelo poder político para votarem numa única formação partidária, esclarece que «quando percebemos que o Presidente da República, João Lourenço, foi eleito em 2017, pensávamos que a troca de favores para com as autoridades tradicionais no sentido de influenciarem o voto a favor do MPLA estaria terminada, puro engano, até piorou muito mais, porque a extrema pobreza em que os angolanos vivem actualmente por causa da péssima governação do MPLA não teria como terminar. A sina do MPLA é governar com corrupção e, sem ela, não faz absolutamente nada, por isso é que o país anda sem norte, sem eira nem beira. A desvalorização das autoridades tradicionais é um projecto do MPLA que vem desde 1975, com a introdução de sobas que não são de linhagem, que só vão de encontro aos interesses daquela formação política e não com os das comunidades», ressaltou.
Para Tiago Katumo, «o poder tradicional tornou-se como um poder político e essas confusões acontecem nos principais partidos políticos angolanos, ou seja, na FNLA, na UNITA, na CASA-CE e mesmo no MPLA, de forma absurda, baralhando a autenticidade do poder das autoridades tradicionais. Assim que o Presidente da República tomou posse no dia 26 de Setembro de 2017, nós escrevemos a exigir que era tempo de o poder tradicional resolver os seus problemas, porque o mesmo não carece de mecanismo jurídicos, nós resolvemos os nossos assuntos através das questões éticas tradicionais e da moral, porque somos as primeiras instituições criadas em Angola que é um manancial do poder tradicional», lembra.
Entretanto, assegura que «os que estão no poder são nossos filhos e netos, beberam em nós, não é só nesta campanha que temos chamado a atenção, nós pedimos prudência desde as eleições de 2008. Temos de unir Angola, o MPLA tem responsabilidades acrescidas e nem precisam de andar pelos caminhos de instrumentalizar as autoridades tradicionais», considera.
Reforça dizendo que «devemos neste período de pré – campanha eleitoral chamar atenção ao Presidente da República para se abster de instrumentalizar o poder tradicional. No tempo de José Eduardo dos Santos, que agora é visto como o mau da fita e já não está no poder, tudo de mal que acontecia em Angola era Jonas Savimbi e agora é José Eduardo dos Santos. Infelizmente mataram Jonas Savimbi, mas José Eduardo dos Santos era como uma figura incontornável, todos nós e até as igrejas, que perderem a moral, foram exaltando Zé Dú, dizendo que foi era o escolhido de Deus, que em Angola não haveria mais ninguém, mas agora estamos a ver o resultado, está a ser excomungado. Da mesma forma como adoraram José Eduardo dos Santos, agora estão a fazê-lo a João Lourenço, que mesmo prometendo acabar com a bajulação, a corrupção, não consegue e está a fazer a mesma coisa que o seu antecessor», lamenta.
Para contornar essa situação, Tiago Katumo aponta que «é só olharmos para a política angolana e inverter o que está a ser mal feito; o soba é um ser humano, mas o soba de linhagem não tem pendentes porque os seus pais não deixaram dívidas com ninguém», concluiu.