O Tribunal Supremo (TS) começou a julgar, quarta-feira (09.12), em Luanda, o antigo ministro da Comunicação Social e ex-director do Gabinete de Revitalização da Comunicação Institucional e Marketing da Administração (Grecima), Manuel António Rabelais, acusado de vários crimes.
Santos Pereira
O julgamento, que começou por volta das 10H30, para além de Rabelais, envolve também Hilário Santos, antigo assistente administrativo do Grecima, contando com 14 declarantes, entre os quais Válter Filipe, antigo governador do Banco Nacional de Angola (BNA), e nenhuma testemunha.
O colectivo de juízes deu início, com algum atraso, à primeira sessão de um julgamento que se prevê muito polémico e de longa duração. Segundo previsões, poderá alastrar-se por semanas ou mais.
Depois da leitura da acusação por parte do Ministério Público (MP), seguiu-se o despacho de pronúncia. Cerca de uma hora depois, a defesa dos arguidos começou a apresentação dos seus argumentos, contrariando as posições do Ministério Público como é óbvio.
Manuel António Rabelais é acusado dos crimes de peculato de forma continuada, violação de normas de execução do plano e orçamento e branqueamento de capitais, puníveis com pena superior a dois anos de prisão, praticados entre 2016 e 2017, enquanto director do extinto Grecima.
O Grecima, que funcionou na era do Presidente José Eduardo dos Santos, foi extinto pelo actual chefe de Estado angolano, João Lourenço.
No princípio de Dezembro corrente, o juiz conselheiro do TS, Daniel Modesto, garantiu que estavam criadas as condições para o arranque do julgamento, na quarta-feira, 09 de Dezembro.
O antigo governante, que é também deputado do partido no poder, MPLA, com mandato suspenso, está a ser julgado na câmara criminal do Tribunal Supremo, depois de, em finais de Outubro, o parlamento angolano ter aprovado, por unanimidade, o projecto de resolução que suspendeu o mandato de deputado e retirou a imunidade a Manuel Rabelais, a pedido do presidente do TS.
O projecto de resolução relativo ao deputado, número 66 da lista de efectivos, do círculo eleitoral nacional do MPLA, foi aprovado com 170 votos a favor, nenhum contra e nenhuma abstenção, permitindo dar continuidade ao processo contra Manuel Rabelais.
Além do ex-ministro da Comunicação Social, que esteve ligado à Palanca TV, Rádio Global, ambos órgãos privados arrestados pelo Estado angolano por terem sido construídos com capital surrupiado ao erário público, está arrolado no processo, como arguido, Hilário Santos, então assistente administrativo do Grecima.
Segundo o despacho de acusação, Manuel Rabelais, auxiliado por Hilário Santos, «transformou o Grecima em autêntica casa de câmbios, angariando empresas e pessoas singulares para depositarem kwanzas em troca de moeda estrangeira», indicando quatro empresas que depositaram valores na conta do Grecima, bem como pessoas singulares, das quais sete estão identificadas.
Foram também feitos depósitos nas contas do Grecima domiciliadas noutros bancos comerciais (BIC, BPC, BAI e SOL).
«De realçar que, à medida que eram adquiridas as divisas no BNA e aprovisionadas nas contas do Grecima nos bancos comerciais, com os depósitos de empresas e pessoas singulares», Manuel Rabelais ia ordenando a Hilário Santos que efectivasse «um plano de levantamento, compra e venda ou transferência das mesmas», lê-se no documento.
O despacho refere igualmente que os arguidos transferiram para fora do país, através do banco BCI, um total superior a 16 milhões de euros para 11 empresas.
Julgamento polémico
Como já foi referido, a sociedade em geral prevê um julgamento bastante polémico e teme-se que não seja justo, porque, segundo a opinião de analistas, este julgamento apenas se reporta a crimes de peculato de forma continuada, violação de normas de execução do plano e orçamento e branqueamento de capitais, «praticados entre 2016 e 2017, enquanto director do Grecima».
Como tem sido amplamente comentado, os crimes de Manuel Rabelais começaram muito tempo antes, mesmo antes de ser ministro da Comunicação Social, na Rádio Nacional de Angola, e só foram aumentando, principalmente durante e depois da realização em Angola do Campeonato Africano das Nações (CAN) em 2010.
A este propósito as análises apontam o facto de, os indivíduos que têm sido constituidos arguidos por crimes de corrupção e conexos, bem como o arresto e/ou a recuperação de activos por parte do Estado serem apenas «uma gota de água no oceano», tanto pelos crimes cometidos, muitos deles levaram a vida de pacatos cidadãos e pais de família, como pela grande quantidade de valores roubados ao Estado angolano.
«Tem-se visto que o gatuno devolve uma “caneca de fuba” e tudo fica logo bem, beneficiam imediatamente de atenuantes com umas palmadinhas nas costas, quando na realidade o indivíduo roubou não apenas um saco de fuba, mas toneladas de bens», exemplifica um analista com ironia, acrescentando que «com Rabelais não será diferente até porque a maior parte dos grandes crimes cometidos enquanto ministro e não só, estão a ser omitidos, e como o Estado recebeu-lhe a TVPalanca e a Rádio Global, vão dar-se como satisfeitos. Mas o indivíduo é detentor de muitas outras propriedades espalhadas por todo o país e de muito dinheiro, tudo roubado ao Estado, que está escondido em Angola e sobretudo no exterior».
O Jornal 24Horas vai continuar a acompanhar o julgamento e a divulgar os delitos que foram cometidos por este criminoso.
