A República de Moçambique continua mergulhada num clima de tensão e morte, a que se acresce os casos de Covid-19. As populações vivem num clima de medo dos “esquadrões da morte”, que seletivamente raptam, torturam e assassinam académicos e ativistas políticos críticos da governação da Frelimo e de Filipe Nyusi.
Diante de tantos crimes, a sociedade continua a desconhecer quem são os mandantes de tanta barbaridade.
Destacam-se algumas vítimas consideradas principais como: – Gilles Cistac, constitucionalista franco-moçambicano, morto a tiro no ano de 2015, em Maputo; Jeremias Pondeca, membro do Conselho do Estado pela Renamo, morto a tiro no ano de 2016, em Maputo; José Jaime Macuane, politólogo, raptado, torturado, baleado e abandonado, igualmente em 2016, em Maputo; Ericino de Salema, jornalista e advogado dos direitos humanos, raptado, torturado e abandonado em 2018 numa via, em Maputo; Anastácio Matavel, líder de um grupo de observação eleitoral da província de Gaza, morto a tiro no ano de 2019, na cidade de Xai-Xai, uma semana antes das eleições presidenciais e legislativas.
Depois do atentado que sofreu, Ericino Salema passou a ser “assediado” pela Frelimo, garantem fontes bem informadas. Ericino Salema continuou ativo e, em Agosto de 2018, preparou a estratégia de defesa e o respetivo recurso de Manuel Araújo ao Tribunal Administrativo, impugnando a decisão do Conselho de Ministros que retirou a presidência do Município de Quelimane ao mesmo, por este ter saído do partido MDM, pelo qual fora eleito, e ter ingressado na Renamo, durante o mandato. Apesar de no recurso de Manuel Araújo não constar o nome de Ericino Salema, é sabido que foi ele quem liderou o processo.
Também de forma discreta, em 2018, Ericino Salema desenhou a estratégia e preparou o recurso de Samora Machel Júnior para impugnar a decisão do seu afastamento à corrida eleitoral à presidência do Município de Maputo. O recurso, que deu entrada no Conselho Constitucional, foi chumbado.
Ericino Salema tem defendido muitos outros casos e o Governo moçambicano, a todo custo, tenta aliciá-lo com benesses e mordomias. Atualmente enfrenta um processo, acusado pelo Ministério de Defesa Nacional e Ministério Público, de crime contra a segurança do Estado, por ter publicado contratos de prestação de serviços de segurança militar aos projetos de Gás Natural Liquefeito de Cabo Delgado, celebrados pelo Governo com as empresas Anadarko e Eni.
Dos vários casos, apenas os assassinos de Anastácio Matavel foram levados a julgamento, pois, na tentativa de fuga, envolveram-se num acidente de viação. Dos cinco ocupantes da viatura em que seguiam, dois morreram, um continua foragido e dois foram detidos, julgados e condenados a 24 anos de prisão. Todos são agentes de uma unidade de elite da Polícia moçambicana, o Grupo de Operações Especiais da Unidade de Intervenção Rápida.
Os diferentes casos que envolvem os “esquadrões da morte” têm em comum que os assassinatos e ou raptos aconteceram à luz do dia em centros urbanos. Os integrantes dos grupos são geralmente agentes da Polícia e, segundo as informações que circulam, fontes do setor da segurança garantem que as instruções partem de dentro da corporação. Na sua actuação, foi identificado o uso de armas e viaturas da PRM.
Apesar dos fortes indícios de que os “esquadrões da morte” agem a mando de fações dos serviços de segurança e mesmo do Governo de Filipe Nyusi, em nenhum dos casos foi determinado o mandante dos crimes. Todas as vítimas têm em comum a oposição pública à Frelimo e a Filipe Nyusi, ou colaboram com a Renamo.
A confirmar tudo isso, houve um acontecimento inesperado. O presideonte da Confederação das Associações Económicas e deputado da Frelimo, Agostinho Vuma, baleado a 10 de Julho, em Maputo, com um perfil diferente das outras vítimas dos “esquadrões”, ao ser abordado pelos assassinos, terá reconhecido um deles e gritou o seu nome: Salimo! S
Os guardas de um prédio da baixa de Maputo, que testemunharam o atentado, contaram o que aconteceu. Conforme apurado, o autor do crime reconhecido, já detido, é membro da Polícia moçambicana.
Agostinho Vuma, deputado da Frelimo, é responsável por organizar no distrito de Chókwè (Gaza) grupos de jovens do partido, apelidados “grupos de choque”, que sabotam atividades políticas de partidos da oposição na província, sobretudo nos períodos eleitorais. Neste papel, Agostinho Vuma operou com agentes especiais da Polícia que integram os “esquadrões da morte” e assim terá conhecido um dos autores do atentado contra si mesmo. É caso para dizer que o feitiço virou-se contra o feiticeiro!
Fontes da Frelimo rejeitam motivações políticas no crime, apontado para divergências com outros membros do partido, motivadas por disputas de negócios, dívidas, bem como por questões passionais.