José Joaquim Laurindo é o novo Secretário-Geral da União Nacional dos Trabalhadores Angolanos – Confederação Sindical (UNTA-CS), eleito no VI congresso de renovação de mandatos que aconteceu em Agosto último e substituiu Manuel Viaje que esteve à frente da organização durante quinze anos.
José Laurindo, como é habitualmente chamado pelos mais próximos, concedeu a sua primeira entrevista exclusiva para o Jornal 24 Horas online. Durante a extensa conversa e reconheceu que não é correcto e é perigoso o não pagamento da segurança social dos trabalhadores pelas empresas e alerta que constitui crime de abuso de confiança.
O sindicalista está preocupado com a forma como o Executivo está a receber as empresas dos antigos governantes que desviaram dinheiro do erário público. Na sua visão, estão a tirar as firmas das pessoas que delapidaram os cofres do Estado, mas estão a colocar as pessoas no desemprego e ninguém reprova a forma repugnante como o estão a fazer.
O também licenciado em Geografia pelo Instituto Superior de Ciências de Educação de Benguela (ISCED), garante a este portal que a UNTA nunca foi um sindicato do MPLA, sublinhando que a UNTA, durante o período da luta de libertação nacional, congregou-se ao partido no poder. Justifica que os antigos líderes da UNTA, muitos deles foram comandantes, mas assegura que, quando começou a luta armada de libertação nacional pelo MPLA, a UNTA já existia.
José Joaquim Laurindo afirma que o sindicato que vai dirigir nos próximos cinco anos vai lutar junto do Executivo para que se implemente o salário mínimo nacional, equivalente a trezentos dólares norte-americanos, porque a cesta básica hoje está acima dos 190 mil kwanzas. O SG garante que vai-se dialogar com o Executivo “até à exaustão” para ser implementado o salário mínimo nacional.
José Laurindo esclarece aos filiados que, nos próximos tempos, vão fazer um profundo diagnostico sobre como está a ser gerido o património da UNTA, ‘’Só sei que muito das nossas infraestruturas ainda está a servir interesses alheios à organização. Estão nas mãos de outras entidades’’, enfatiza. Eis a entrevista na integra:
Domingos Cazuza
Jornal 24 Horas (J24H) – Sr. Secretário-Geral que UNTA-CS teremos nos próximos cinco anos?
José Laurindo (JL) – Vamos continuar a dar uma maior atenção na direcção como linha principal, como é o caso de potencializar os sindicatos e estaremos em condições de sabermos com que balizas vamos nos cozendo, porque o nosso principal objectivo é a representação dos trabalhadores da base ao topo. Quando as exigências dos trabalhadores estiverem direcionadas para o topo e nos obrigarem que a gente tem de fazer algo, temos que ter a rectaguarda segura, por isso tudo que vamos fazer agora vai no sentido de trabalharmos com os sindicatos. Sabermos como é que estamos. Se qualquer medida que a gente possa tomar vale a pena, porque nós não temos como. A UNTA-CS, como costumo dizer, é como o ‘’crocodilo’’, animal também conhecido por jacaré, que só tem força quando está na água; fora dela não tem energia, como é o nosso caso. A nossa força reside nos trabalhadores. Os trabalhadores são os que constituem os sindicatos.
J24H- Nos últimos anos as centrais sindicais angolanas perderam muitos filiados derivado do encerramento de postos de trabalho, e isto criou o grande flagelo de desemprego. Como é que o Sr Secretário-Geral vai reverter esta situação?
JL – Eu não tenho a varinha mágica para reverter, porque o emprego tem a ver com o esforço da sociedade, quer a colectividade empresarial, quer o Executivo. Vamos continuar a lutar para os que hoje estão empregados mantenham os seus postos de trabalho protegidos, por isso o nosso lema: ‘’com os sindicatos o trabalho é mais seguro’’; mas para manter os cargos não é irem para o serviço e sentar na porta da empresa sem produzir nada. A menos que esta empresa não tenha matéria – prima, nem meios para funcionar e não tem produtividade. Se não o tem, não há lucro, e não tem como pagar, e o desemprego vai continuar. Vamos trabalhar no sentido, para que as empresas não despeçam mais trabalhadores de forma abusada como tem acontecido e, para tal, temos de manter um diálogo permanente com o Executivo e com as suas dependências. Vamos continuar a dialogar muito em relação ao financiamento das empresas por parte dos bancos. Só assim é que teremos firmas seguras.
J24H- Sabemos que em Angola os bancos não financiam as empresas privadas. Não acha que se isso acontecesse iria diminuir o encerramento de muitas empresas e também salvaguardava o emprego de muitos angolanos?
JL- Se os bancos continuarem a não financiar as empresas, infelizmente vamos continuar a assistir um número elevado de desemprego como temos registado nos últimos seis anos. Essa perda dos postos de trabalho por muito mais tempo, como acontece nas empresas de construção civil, saneamento e outras tantas, não vai trazer sucesso ao Executivo, porque é muita gente sem qualquer ocupação. O país está em reconstrução e tínhamos muitos postos de trabalho, mas por falta de pagamento de algumas empreitadas já acordadas, os trabalhadores acabaram por perder os seus serviços, com muita pena. Mas como movimento sindical não temos como inverter. Até porque a nossa acção se realiza com os trabalhadores.
J24H- Senhor Secretário-Geral seja mais objectivo?
JL – Quem não é trabalhador não tem como reivindicar. Quem é que vai pegar no exército de desempregados para fazer uma greve? – Quem não trabalha não tem como fazer greve. Vai fazer contra quem? – Se não trabalha, a única alternativa são as manifestações que, lamentavelmente, temos estado a assistir e com muita justiça. Estes as têm feito para exigir a quem de direito. Nós não somos responsáveis para quem não trabalha, vamos é ter responsabilidade de dialogar com aqueles que já estiveram empregados e que hoje estão no desemprego e que devem merecer uma maior atenção. Por isso, o Executivo deve criar um fundo de desemprego, para que, quando os postos de trabalho não se repõem, haja um Fundo de Desemprego como em muitos países do mundo civilizado e humanistas . Quando as pessoas perdem o emprego por razões exógenas ou endógenas do momento em que ficou desempregado, existe sempre um fundo que assegura o trabalhador para poder sobreviver até conseguir um outro serviço.
J24H- O Ministério da Administração Pública Trabalho e Segurança Social (MAPTSS), através do seu Secretário de Estado disse, no ano passado, que Angola não estava em condições de fazer o pagamento do Fundo de Desemprego. Acha que o MAPTSS não esteja em condições de fazê-lo?
JL- Nunca nos demonstraram por A mais B que não existem condições para efectuarem o pagamento do Fundo de Desemprego. Ele é de lei. Vamos continuar a exigir que isto se faça. Têm que provar técnica e economicamente. É preciso que o MAPTSS, através do Instituto Nacional de Segurança Social tenha de fazer o cadastramento de quem merece este fundo. Eles nunca o fizeram. E se o fazem, estão a fazê-lo de forma isolada. Têm de envolver o movimento sindical, que conhece bem as empresas que faliram e as pessoas que estão no desemprego. Se estão a dar dinheiro no programa Kwenda, que é de 25 mil Kwanzas por trimestre, podem fazer o mesmo com as pessoas desempregadas. Aquelas que já trabalhavam. O MAPTSS nunca abriu o jogo para um debate com o movimento sindical para falarmos do Fundo de Desemprego. Qual é o seu capital? Mas vamos lutar para que se pague os tais valores.
J24H- Mas nas empresas públicas coloca-se a situação da falta do pagamento da segurança social. Isto não o preocupa?
JL- O número de desempregados é maior nas empresas privadas. Nas empresas públicas não se coloca esta situação. O que se vê é que nas empresas do Executivo não estão a colocar as pessoas na reforma. Com 70 anos de idade ainda continuam a trabalhar, porque nos sectores da educação e da saúde não existem condições de ingresso de novos quadros. Falando na educação neste preciso momento, sem medo de errar, o país precisava de pelo menos sessenta mil novos professores para colmatar o déficite das pessoas que estão em idade de reforma e daqueles que morreram. Vamos continuar a pressionar o Executivo. Temos muitos idosos que não conseguem andar e estão nas aldeias longínquas onde os jovens recém – admitidos não aceitam lá ir por falta de incentivos. Os professores idosos estão a leccionar as 5ª, 6ª, 7ª e 8ª classes, dando aulas a todas disciplinas, violando o decreto presidencial que proíbe a mono – docência. Ela já não devia existir, mas com o retorno das aulas o problema persiste.
‘’Vamos exigir que o MAPTSS pague o fundo de desemprego’’
J24H- O senhor fez referência há bem pouco tempo que o sector da educação em todo o país necessita de sessenta mil novos professores. Está esquecido que neste sector precisa-se também de novos guardas e trabalhadores de limpeza que estão também em idade de reforma?
JL – A menos de seis meses ingressou pessoal para a área administrativa que foi uma gota no oceano e não cobriu as exigências. Existem províncias que receberam trezentas vagas e existem municípios que têm mais de trezentas escolas. As escolas vão até às aldeias, comunas e nos locais recônditos do país. Falar do professor é a mesma condição do médico e do enfermeiro. Nas escolas na maior parte das vezes quem varre as salas são os alunos e os professores. Existem escolas que não têm funcionários administrativos, não têm guardas; colocam portas nas escolas e no dia seguinte são roubadas; as carteiras servem de mesa nas casas. Os professores, os médicos e os enfermeiros que estão nas aldeias deveriam ter uma atenção especial e deveriam ser bem remunerados; infelizmente assim não acontece. Temos de dialogar para chegarmos a um entendimento.
J24H- A Segurança Social para além das empresas públicas, são os privados que mais se furtam ao seu pagamento. A lei admite pena para os seus incumpridores mas o que se vê é que isto não é aplicado. Porquê?
JL – Vamos passar a exigir que se cumpra a lei na sua integra e se aplique penas. Neste prisma, os sindicatos têm muito que dizer, através de denúncias, as autoridades devem autuar e não sonegar como tem acontecido em muitos casos. Não é correcto e até perigoso o não pagamento da segurança social dos trabalhadores e constitui crime. Essa luta não é da UNTA directamente, mas sim dos sindicatos.
J24H – Senhor Secretário-Geral, o INSS assume de forma pública que as empresas não pagam, mas violando a lei tem estado a negociar com aquelas instituições devedoras. Porque a lei não permite negociações. Qual é o seu ponto de vista?
JL – Claro amigo jornalista; o país esteve em guerra durante quanto tempo, durante muitos anos. Acabamos com a guerra negociando. Negociação é sempre necessário. Se você não negociar perde. À força não vai-se ter nenhuma vantagem. Pode-se prender um empregador que não tem dinheiro naquela altura, mas que de forma faseada, durante um ou dois anos, vai efectuar o pagamento e se calhar o Executivo fica a ganhar. Isto é como na luta contra a corrupção; estamos a tirar as empresas daqueles que têm dinheiro que dizem que foi roubado ao Estado, mas estão a colocar as pessoas no desemprego e ninguém diz nada. Os jornalistas não divulgam nada. Não está correcto. Negociem com os donos. Os Kero estão a fechar e os trabalhadores estão a perder os seus postos de trabalho, quando o novo dono chegar vai trazer o seu pessoal. A visão do INSS é a mais correcta, só que não pode vacilar e nem tão pouco deve perdoar as dívidas. O INSS não pode fazer sozinho e deve incorporar os movimentos sindicais.
J24H- Senhor José Laurindo alguns analistas sociais dizem que a UNTA-CS é uma organização que perdeu força na nossa sociedade. Concorda com este ponto de vista?
JL- Não concordo com esse ponto de vista. Para nós o diálogo com o Executivo está muito aquém daquilo que a nossa sociedade mais deseja. Alguns dizem que a UNTA-CS está invisível, mas ela existe, porque os sindicatos existem. Basta que os sindicatos se movimentem e a UNTA-CS vai ter muita responsabilidade para representar os sindicatos. Penso que a UNTA-CS para ser visível tem que apostar nos sindicatos que é a sua base.
J24H- A Lei n.º 7/15, de 15 de Junho, Lei Geral do Trabalho, depois da sua promulgação, os sindicatos deram conta que não beneficiava os trabalhadores, mas sim o patronato. Em função disto começou-se uma reclamação pelo número de despedimentos. O Senhor herda um passivo da revisão da Lei Geral do Trabalho. Qual será o seu grande contributo?
JL – As equipas já estão constituídas, quer da UNTA-CS, quer da CGSILA e da FSA-CS. Nós não vamos mexer na equipa. Vamos dar seguimento. O que vamos fazer é monitorar se as pessoas que estão nesta equipa são ou não capazes. Vamos ver no mercado para que haja assessores nas áreas económicas e jurídicas para darem alguns imputes à nossa equipa. A UNTA-CS somos todos nós e estou a entrar na direcção da organização para substituir um executivo que em função estatutária cumpriu com o seu mandato, tanto é que não estamos a herdar nada. Estou para seguir aquilo que não foi feito, como hoje está na mó de cima a palavra ‘melhorar o que está bem’, e ‘corrigir o que está mal’. O que está mal vamos corrigir e o que estiver bem vamos dar continuidade para melhorar.
J24H – Muitos sindicalistas reclamam que a actual Lei Geral do Trabalho teve muitas falhas; na vossa lógica aonde é que a norma trabalhista falhou?
JL- Eu disse muitas vezes que nós estamos num diálogo, ou seja, é como um processo que está em instrução preparatória, posso sim dizer que este é um assunto que está em segredo de justiça. Não me parece muito ético estarmos a esmiuçar coisas que nós vamos dialogar, como matérias que estão mal na Lei vigente, coisas que não estão bem identificadas. As três centrais sindicais já identificaram as coisas ruins da Lei Geral do Trabalho e na devida altura, se nós não conseguirmos lograr, e espero que não seja isso, no final vamos aparecer a público dizer quais foram os aspectos negativos e positivos. Mas agora não é ‘católico’ falarmos deste assunto.
“O património da UNTA está a ser mal gerido”
J24H – As três centrais sindicais, a UNTA-CS, a CGSILA e a FSA-CS, afirmam em mais de dois milhões de desempregados, mas o Executivo fala que cerca de quinhentos mil trabalhadores perderam o emprego devido à pandemia da Covid-19. Qual é o seu comentário?
JL – Se o meu caro jornalista voltara a me entrevistar dentro de noventa dias já lhe posso dar uma resposta mais coerente. Sou o Secretário-Geral eleito, não quero errar por emoções, quero preservar o que é a nossa organização, eu quero falar com dados. Vou trabalhar para obter os melhores dados e só assim posso falar com precisão e clareza. Vou trabalhar com as outras centrais sindicais, com a CGSILA e a FSA-CS, aliás uma delas já manifestou o seu interesse em trabalharmos juntos. Vamos efectuar o levantamento das pessoas desempregadas, estamos a dizer aqueles que já estiveram empregados e por razões óbvias das empresas foram parar no desemprego. Nós não estamos a falar daqueles que procuram empregar-se e que são milhares e milhares. Não acredito que não tenhamos acima de meio milhão de jovens que nunca tiveram emprego.
J24H- Foi eleito recentemente no VI congresso que aconteceu no mês de Agosto último. Vive em Benguela. Pelo que sabemos vai despachar os assuntos correntes da organização nas terras das Acácias Rubras. Vai mesmo viver em Benguela ou em Luanda?
JL – Não, eu nunca disse que vou viver em Benguela. Eu vou trabalhar na UNTA. O que é a UNTA? – É o conjunto das associações. Temos os sindicatos que estão em todas as províncias, em todos os municípios e em todas comunas. Temos as uniões dos sindicatos e as federações que estão nas dezoito províncias. Vou trabalhar com eles. Eles não estão sedeadas apenas em Luanda, estão localizadas em todo o país. Eu vou trabalhar na UNTA, o que implica dizer que aonde estiver a UNTA vou lá trabalhar. Agora o meu escritório está em Luanda. Sempre que necessário estarei em Luanda, mas isso não me preocupa. Tenho residência em Benguela e fui dirigente sindical naquela província. Vou ver aonde vou viver. Se a UNTA central tem condições para me albergar vou ficar. Mas que fique bem claro que eu não concorri para trabalhar de segunda a sexta, de Janeiro a Dezembro na UNTA central, não, eu vou andar em todas as províncias e municípios para dar o meu calor humano e o incentivo aos sindicatos que é a razão da existência da UNTA.
J24H- Senhor SG, a UNTA até 1990 era um sindicato que tinha o controlo do MPLA. Acha que essa colação ainda persiste?
JL –É uma situação muito difícil de responder, porque o entendimento das pessoas que vão ler a entrevista será esse. Só para dizer que a UNTA nunca foi um sindicato do MPLA. É preciso sublinhar que a UNTA, durante o período da luta de libertação nacional congregou-se ao MPLA, os seus líderes, muitos deles, foram comandantes, mas quando começou a luta armada de libertação nacional a UNTA já existia. Tanto é que há uma infeliz colagem que alguns cidadãos fazem de sermos um produto do MPLA. Não. Agora estamos num momento multipartidário. Temos na UNTA filiados trabalhadores e dirigentes que pertencem a outras formações políticas, como são os casos da FNLA, MPLA, UNITA, PRS e da CASA-CE. Isto é normal. Somos uma organização apartidária, os seus líderes não são apolíticos, são militantes de vários partidos.
J24H- Então vocês não têm qualquer analogia com o MPLA?
JL- Não temos qualquer semelhança com o MPLA. A UNTA teve sempre afinidade pelo MPLA, porque o MPLA era o partido – Estado. Se estiverem bem recordados, no tempo da Assembleia do Povo, nos municípios havia pastores e padres que eram deputados, isso era normal. Não é o que se coloca agora. A UNTA tem ainda finalidade com o MPLA, mas uma coisa fique bem claro, nós não somos uma organização do MPLA, não somos isso, e se fossemos, deveriamos assumir. Se um dia tivermos que estabelecer alguma aliança com algum partido, seja com o próprio MPLA ou com uma outra formação política na oposição, nós vamos assumir e não teremos receio de o dizer em público. Mas que a UNTA não é aquilo que as pessoas pensam. Nós temos estado em todos os processos orgânicos do país, sobretudo no período eleitoral. Vamos estar em seminários sobre o movimento sindical sobre as eleições.
J24H- Senhor José Laurindo seja mais claro nesta explicação…
JL- Nós vamos apoiar fortemente o processo eleitoral no país. Todos nós vamos participar no sentido de apelação ao voto, para quem trabalha, deve ir ao voto. Mas não vamos indicar em quem devem votar, se na UNITA, no MPLA, na FNLA, na coligação CASA-CE, ou mesmo numa outra formação política. Não vai acontecer isso. Damos a nossa garantia a todos que isto a UNTA não vai fazer. Os militantes do MPLA que estão na UNTA vão trabalhar junto das populações para influenciar o voto junto das suas organizações partidárias, e assim vai acontecer com os militantes da UNITA, da FNLA e da coligação CASA-CE. Não vai haver nenhum discurso do Secretário-Geral da UNTA e dos seus membros de direcção a orientarem o sentido de voto por parte dos seus filiados para o partido A ou B. Agora, se o Secretário-Geral for do MPLA e o seu partido o chamar para fazer campanha a favor do MPLA, de certeza que o vai fazer, mas como militante dos ‘’camaradas’’, não como Secretário-Geral da UNTA.
J24H- Fez referência sobre as alianças que os sindicatos podem fazer com as formações políticas no sentido da orientação de voto. Caso o MPLA, a UNITA, a FNLA, a coligação CASA-CE ou outra lhe solicitarem uma aliança de voto, qual será a vossa exigência?
JL – Gostaríamos de fazer acordos com todos e não com uma única formação política. Eu prometo visitar todas as formações políticas com assento parlamentar. O acordo que faremos com estas formações políticas é a mobilização dos trabalhadores para irem ao voto, mas desde que as formações políticas nos assegurem que nos darão uma percentagem para deputado na Assembleia Nacional. Isto é uma aliança. Vamos fazer com o MPLA, com a UNITA, com a FNLA e com a coligação CASA-CE; vamos apresentar-lhes esta proposta. Nós queremos a representação dos sindicatos na casa das leis. Assim, queremos deputados que atendam às questões trabalhistas, embora em representação do partido que o elegeu, se for para votar assuntos dos trabalhadores, terá que se aliar a outras bancadas parlamentares.
J24H- Como é que analisa as propostas dos partidos políticos em época de campanha eleitoral? Prometem um determinado número de emprego e quando ganham as eleições abandonam completamente aquilo que disseram. Não acha que as formações político – partidárias deveriam chamar os sindicatos para darem algum subsidio nas questões trabalhistas?
JL- A campanha eleitoral é uma campanha política. Na política todo serve. Ela é feita pelos homens. Às vezes o INAMET prevê chuva em Luanda mas ela não cai, porque previsão é sempre previsão. Na minha terra tem um ditado popular que diz: ‘a flor do feijoeiro não é feijão’. Então são previsões e se não se cumprirem vão ter que rever. O que se aconselha que haja um pouco de cuidado nas previsões que nós fazemos para não cairmos em falsas promessas. Como veem, sempre prometemos o mínimo para ultrapassarmos a fasquia.
J24H- Como é que analisa o desempenho do Executivo em relação à aplicação das políticas trabalhista?
JL- O mundo só respeita os fortes. Se és fraco ninguém te vê, e todos ignoram. Vamos trabalhar no sentido de que aqueles que têm direito de prometer ao povo ou mesmo à sociedade alguma coisa que tem a ver com os trabalhadores, reconheçam e sintam a nossa existência se nós mostrarmos que existimos. Ninguém conhece a cor do vento, mas a gente sente e vê a sua acção. Se nós não tivermos acções que mexam com a sociedade, com o Executivo e com as empresas, acções reais de luta sindical, logicamente que vão nos prometer e nunca vão cumprir, nem tão pouco nos consultarem. Nós apostamos dirigir a UNTA para mudarmos este cenário. Logicamente temos de contar com os trabalhadores.
J24H- Uma das suas bandeiras durante a campanha eleitoral foi a luta por um salário mínimo nacional equivalente em trezentos dólares norte-americanos, em que variante se baseia?
JL- A longo tempo que o movimento sindical angolano, sobretudo a UNTA, outros defendiam mais que nós, tem estado a lutar para que o salário mínimo nacional equivaleria a trezentos dólares norte-americanos. A cesta básica está acima deste valor, ronda os 190 mil Kwanzas. O que nós pretendemos é dialogar com o empregador, entre os quais o Executivo que é o principal, que esse salário seja implementado. Depois de implementado, que sofra um incremento que se aproxime ao custo da cesta básica. Essa é uma luta que não é promessa e nem tão pouco é uma ameaça. Nós vamos lutar até que nos entendermos com o empregador. O valor do salário que se atribui hoje, e que ontem estava acima de cento e cinquenta dólares, já não chega a 30 dólares e assim não temos como sobreviver.
J24H – Mas o Executivo reclama que não tem dinheiro e que o país está na bancarrota?
JL – Ainda não ouvimos o Executivo a vir a público em declarar falência do Estado. As empresas quando não têm como pagar declaram falência. Ainda não ouvimos isso e vamos negociar com o Executivo. Que eu saiba é que o país não está em falência, nem técnica, nem política.
J24H- Sabemos que a UNTA tem um enorme património. Como é que vocês estão a gerir esse património?
JL – Todo acervo dos movimentos sindicais da era colonial estão em posse da UNTA. Agora a forma como está a ser gerido, vamos averiguar como é que está a sua gestão. Só sei que muito deste património ainda está a servir interesses alheios à organização. Estão nas mãos de outras entidades. Vamos trabalhar neste dossier nos primeiros seis meses.
J24H – A UNTA está em condições de convocar uma greve nacional, caso o Executivo não satisfaça muitas das vossas exigências?
JL- Os que falam que a UNTA não está em condições de convocar uma greve nacional estão deslocados no tempo, ou seja, são jovens e nasceram depois dos anos 2002, e se não o são falam demais. A UNTA já fez greve em Angola. Já fizemos uma greve nacional nos anos de 1997 e 1998 em todas as capitais provinciais. Mas quem faz a greve não é a UNTA, quem faz a greve são os trabalhadores. Os trabalhadores é que estão no sindicato. Eu nem sequer, como Secretário-Geral da UNTA, vou convocar uma greve nacional quando não sei aonde estão os trabalhadores que vão fazer a greve, não faço isso. Eu não cairia nesta hecatombe. O congresso aprovou uma resolução que orienta que a nova direcção deve apresentar um caderno reivindicativo, que deve ser tratado, ou seja, o seu fim é a negociação que significa a busca de consensos.
J24H – Qual é a estratégia que vai levar para o Executivo em relação à reivindicação de um filiado da UNTA que reclama por ter sido suspenso da sua actividade laboral? Estamos a falar do presidente do Sindicato dos Médicos de Angola…
JL – Não sei… até porque este sindicato foi admitido agora neste congresso. Vamos fazer o diagnóstico e ouvir as partes. Vamos também ouvir os secretariados provinciais afectos ao Sindicato dos Médicos. O que sabemos é de âmbito nacional. O que é que eles já fizeram e vamos ajudar naquilo que nos pedirem. Não sei se eles já pediram a nossa intervenção, porque ajuda também solicita-se. Não tenho como lhe dar uma resposta satisfatória, mas ao nível superior da UNTA em nenhum momento discutimos este assunto.