Início Economia Laurinda Hoygaard afirma – “O Estado não honra os compromissos”

Laurinda Hoygaard afirma – “O Estado não honra os compromissos”

por Redação

A atual situação sócio-económica do país é deveras degradante e, apesar das medidas que o Executivo anunciando, não se perspectivam melhorias, enquanto os governantes angolanos não mudarem de postura. Assim, as políticas e medidas da equipa económica do Governo continuam a gerar reservas junto de investidores que não acreditam nas políticas angolanas.

Francisco Manuel

A conceituada acadêmica e economista Laurinda Hoygaard tem defendido um país inclusivo e com oportunidades para todos, que potencie os privados para o fomento da economia. A especialista aconselha para que haja mais economia de mercado e lembra que Angola tem uma herança política pesada.

Em relação à atual realidade socioeconómica do país, considerou, numa entrevista concedida há algum tempo, que “o ambiente macroeconómico é uma componente muito importante do ambiente social. Há questões macroeconómicas fundamentais que ainda não estão resolvidas e estão em processo de criação”.

Em sua opinião, “a organização social de Angola ainda está em construção. Há uma série de reformas do Estado em curso que podem redefinir, no médio prazo, a estabilidade macroeconómica, tais como as medidas do Banco Nacional de Angola CBNA), que está a introduzir nova regulação na concessão de crédito e outras iniciativas para a estabilidade financeira”.

Ao longo de tantos anos, disse, houve um desmoronamento de valores, que é um sentimento partilhado por muitos angolanos. Temos de criar a sociedade com “um só povo e uma só nação”. Marcolino Moco lembra isso no seu livro, onde apela à reflexão. No entanto, ele dizia que não está de acordo que se faça a revisão da Constituição. A revisão da Constituição não deve ser um processo imediato, mas a discussão, o debate, a inclusão da sociedade para esse objetivo que deve ser iniciado com força, exatamente em paralelo com a reforma do Estado.

No entanto, diz não corroborarda opinião de Marcolino Moco “na matéria da não revisão, não alinho. Mas partilho com ele a preocupação relevante à construção do Estado-nação. Isto reflete-se na vida das empresas e das pessoas. Nem todos têm as mesmas oportunidades no nosso país. O Governo está a trabalhar para a estabilidade macroeconómica e financeira do país para criar riqueza para as famílias. Temos de trabalhar. As pessoas devem-se sentir parte da solução dos problemas macroeconómicos e financeiros. O país tem de ser gerido por todos, independentemente da sua filiação partidária”.

Quanto ao ceticismo dos investidores estrangeiros, afirma que “a captação do investimento estrangeiro ou mesmo nacional depende da confiança. E só se consegue quando houver normas, regulamentos e um sistema jurídico-legal justo, que efetivamente dê oportunidades a todos. Há que estabelecer prioridades para atrair investimento, quer dizer, não há clareza sobre a questão da propriedade para estimular os investidores, sejam nacionais ou estrangeiros. A questão da propriedade está associada à problemática do crédito, que é uma componente importante nos investimentos, sobretudo nacionais”.

Para ela, a disponibilidade de crédito é “a alavancá fundamental, um pressuposto necessário para a economia. Para que isso seja realizável, o Estado deve reduzir a sua presença na economia e deixar de concorrer com o setor privado na captação de fundos e na sua transformação em investimento. O Estado tem captado muitos dos fundos e das poupanças disponíveis a nível interno, aplicando-os na organização administrativa pública. Os dias são de abertura e o Estado passou a compreender melhor que tem de haver uma racionalização no próprio aparelho governamental, no orçamento, na maneira como as despesas públicas são feitas, com objetivos bem claros e avaliação de resultados. Ao compreender-se isso, podemos esperar que haja excedentes e reinvestir”.

Quanto ao crédito à economia, é de opinião que “a banca tem o Estado como melhor cliente do que o privado, porque este não oferece garantias. O Estado paga os juros definidos. No entanto, as poupanças da sociedade não são suficientes para cobrir a folha de solicitações de financiamentos à banca comercial. Precisamos de ter um empresariado forte e competitivo. O empresariado é preterido porque o Estado faz recurso ao financiamento interno para assegurar o funcionamento do aparelho do Estado. Valorizo o trabalho do BNA na regulação dos processos financeiros no país. Há dificuldades, sim, se olharmos para o passado, mas vamos ter resultados positivos”, disse, acrescentando que “é um projecto positivo porque se destina ao apoio às iniciativas empresariais. Veio para contrariar os constrangimentos que têm surgido no financiamento às iniciativas empresariais. Não podemos colocar apenas exigências ao sistema financeiro e creditício ao próprio Estado. Os empresários têm de adoptar este princípio da eficiência e da racionalidade para serem credíveis. Ao longo dos anos vimos potenciais investidores que recorriam à banca para projectos e que desviavam esses fundos”.

Contudo, em relação aos verdadeiros beneficiários do PAC, “tem de haver maior exigência e regulação do BNA ao definir as normas da concessão de crédito. Os empresários devem ser orientados quando fazem os seus projetos, para a sua racionalidade e eficiência. Não vale a pena fazer investimentos que, à partida, não são rentáveis. Têm de ser projectos que beneficiem o país, que criem lucro e reservas para incrementar os seus negócios e satisfazer compromissos”.

Mas, afirmou, “tem de haver maior comunicação interinstitucional. As instituições públicas e as organizações empresariais têm de ter o à vontade de conversar com os sectores e as regiões para reduzir as assimetrias regionais. É preciso informar a Nação sobre quais as políticas definidas pelos diferentes ministérios para o incentivo à produção interna. Estabelecer prioridades a curto, médio e longos prazos para que haja resultados. As políticas públicas a implementar têm de ser mais concretas, para evitar ciclos viciosos que, no final,não dão em nada. Os ministérios têm de nos dizer as políticas que vão implementar para que haja sucesso nos programas. Ao P AC podemos associar o PDN 2018 – 2022 como um instrumento que, bem acompanhado, pode dar resultado até ao fim desta legislatura”.

Falando da problemática dos combustíveis, disse que é um sector com muitos conflitos e interesses, considerando que“as restrições no abastecimento dos combustíveis nunca foram preocupação do Governo. A construção de refinarias nunca foi prioridade, porque houve uma atuação que não foi correta no país. Houve conflito de interesses sim, quer públicos, de organizações, e privados de grupos de pessoas. Os conflitos de interesse nos combustíveis afetaram a nossa realidade económica e em todos os planos. E é preciso que haja clareza. Fico feliz se alguém me disser que não se entrou nesse caminho porque se calhar havia condições objetivas que impediram ou que os interesses privados prevaleceram sobre o todo nacional”.

“A solução passa por criar infraestruturas para transformar o petróleo e não ficar dependente do exterior. Algo está a ser feito, nomeadamente a reestrutu ração da Sonangol e do próprio sector dos petróleos, que é uma das prioridades da agenda política do Governo. Temos de dizer que a herança política é muito pesada. Muitas das restrições que temos foram criadas nos tempos mais recentes da nossa história”, aconselha.

Falando doa retificação do orçamento, disse que houve redução da despesa, “mas não sei o tipo de despesa. Acredito que a única despesa afectada é a de investimentos porque a despesa corrente exigiria a reforma total do Estado, o que passaria pela redução do pessoal no sector público e isso não foi feito. Quanto aos investimentos, acredito que existem muitos em curso e muitas obras a meio, por isso, defendo que haja continuidade destes investimentos. Entendo também que haja mudanças na estrutura para investimentos existentes. Ao longo dos anos, fomos inscrevendo sempre despesas novas sem que houvesse uma avaliação dos investimentos dos anos anteriores. A qualidade também é questionável”.

 “O Governo deve criar um fundo de estabilização ou de desenvolvimento para apoiar o programa de diversificação da economia. Relativamente ao OGE, deixo uma preocupação, que gostaria que não se repetisse. É à questão entre a aprovação e a execução do orçamento, que tem sido constrangedor. Isso tem criado transtornos na economia e na sociedade. É o caso das empresas que prestam serviços ao Estado e acabam ficando anos sem serem pagas e, como consequência, os despedimentos, porque o Estado não honra os seus compromissos”, alertou a especialista, acrescentando que várias empresas encerraram devido aos atrasados do Estado. Quando falamos de economia, há duas questões fundamentais, nomeadamente a produção, e aqui não falo de servir de intermediário, como o comércio, apesar de ser importante para completar a cadeia de produção. E a outra é o emprego. É preciso apoiar as grandes e pequenas empresas.As micro, pequenas e médias empresas devem constituir o objetivo principal do Estado para alavancar o crescimento, com base em exigências e evitar laxismos. Tem de haver disciplina. Aos produtores deve ser garantido o mercado dos seus bens e deve ser assegurada a mobilidade das pessoas do campo para os centros urbanos para comercializarem os seus produtos. É papel do Estado criar esta cadeia para assegurar o crescimento da economia e aumentar os rendimentos das famílias”.

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