O semba é a expressão rítmica mais popular da música urbana angolana resultado da fusão da rebita, trazida pelos portugueses com kaduque, um sapateado forte e bonito que os pescadores angolanos e algumas populações do interior dançavam no final do século XIX
O semba é música/dança da região sócio – cultural quimbundo (kimbundu) e evoluiu a partir da estrutura da massemba até tomar a forma actual. Embora os produtores musicais não aceitam identificar o Semba como nosso símbolo musical, preferem levar para o exterior o kuduro, a bandeira da música angolana é o Semba e não o kuduro.
A denominação Semba deriva do choque (umbigada) entre dois intervenientes da dança rebita ou massemba, quando ela atinge determinada apoteose no tempo mais forte do compasso. Semba é singular, enquanto o prefixo ‘’ma’’ em massemba determina o plural.
O Semba como género musical, também é música/dança de carnaval. Começou a ser definido nos anos 40/50 do século XX, pelo grupo musical Ngola Ritmos, liderado por Liceu Vieira Dias, e nos anos 60 ganha projecção, alimentando-se de outros estilos, fundamentalmente do rumba do ex- Zaire, actual RDC, e das músicas latino –americanas. Entretanto, o período de consolidação do Semba vai de 1961 à 1974.
Porém o músico dos anos 50 defende que o Semba surgiu primeiramente como um aglomerado de vários ritmos nacionais, nomeadamente a dizanda, caixa – corneta, kabetula e kazukuta, marcando a transição para o espaço urbano.
Em termos de definição cientifica, o Semba é um género de compasso quaternário, de ritmo sincopado, no qual a percussão e a guitarra – solo desempenham papel fundamental, enquanto a dikanza na sua cadência realça esse género musical.
A sincopa entende-se como um prolongamento da parte forte, do compasso que vai até à parte fraca, explica um professor de música. Este tempo forte, quando se prolonga para o tempo fraco, produz a sincopa que é uma grande riqueza a nível da música mundial como é o caso do jazz e de outros estilos. O Semba tem esse valor rítmico, por isso é admirado a nível mundial.
O Semba tem duas variantes que são a kazukuta e a kabetula. A kazukuta foi em tempos uma dança designada ‘’kazuze’’, em que só dançavam carpinteiros. A kazukuta tem um andamento extraordinariamente forte e constituiu-se numa das mais ricas da região de Luanda, mas tem sido pouco desenvolvida, até podemos dizer que está em vias de desaparecer.
Portanto, o Semba é das várias expressões de música angolana que personaliza a maneira de estar e de sentir do angolano. Este ritmo ganhou uma certa dimensão no território nacional, resultado do facto de ser produzido em Luanda onde há formas de divulgação maiores que em outras regiões do país, daí o Semba ter crescido e se espalhado pela nação, porque os grandes investimentos em termos de música foram feitos na capital.
Os grandes cultores desse género musical, incontestavelmente uma das expressões mais autênticas de produção musical dos angolanos com identidade própria, são Elias Dya Kimuezu, Carlos Lamartine, Urbano de Castro, David Zé, Artur Nunes, Belita Palma, Lourdes Van-Dúnem e uma lista interminável de nomes.
Nos últimos anos, o falecido cantor Carlos Burity revelou-se na grande referência do Semba. Ele é o artista que mais privilegiou o estilo Semba nas suas obras discográficas, merecendo por isso o título de «Rei do Semba». Contudo, o Semba tem sido o género mais mediático de Angola e é o estilo que ultimamente mais toca em festas, devido à sua larga produção.
Actualmente, é notório que os jovens da nova geração da música angolana, de diferentes regiões etno – linguísticas, estão a interpretar o Semba com muita perfeição. É interessante ouvir interpretações de sembas nas vozes dos irmãos Almeida, de Flay, de Isidora Campos, de Sabino Henda, de Don Kikas, de Maya Cool, de Vina, de Yé –Yé, Puto Português, Yuri da Cunha e tantos outros cantores, que cantam Semba com alegria, mostrando que o Semba não é música só de Luanda, mas inequivocamente de toda Angola.
Semba é a nossa bandeira
Paulo Flores, das referências mais positivas da segunda metade dos anos 80 no «music – hall» angolano na diáspora, na sua canção Poema do Semba, exalta o Semba e define-o como a «nossa bandeira, a nossa forma de cantar…». «A voz do meu Semba urbano/é a voz que me faz suportar o orgulho de ser angolano/o Semba é a nossa bandeira/a nossa forma de cantar…». Extracto da canção de Paulo Flores.
Tito Paris, músico cabo-verdiano de renome internacional, ao referir-se a Paulo Flores como defensor do Semba, observa que o cantor mostra aos jovens artistas dos países africanos de língua portuguesa, na sua maioria apologistas do zouk e do rap, «que os estilos tradicionais também podem levar ao topo».
O cantor Carlos Lamartine, na sua canção intitulada A Razão do Semba, enobrece as figuras proeminentes do carnaval de outrora que executavam «o ritmo Semba na sua forma natural». Na sua canção Semba Dilema, o conceituado cançonetista Dom Caetano faz apologia do Semba e desabafa que: «…o universo tem que saber que o rico Samba nasceu do meu Semba». E o refrão: «Samba é filha de Semba, não é ficção de cinema».
Bonga Kwenda, indiscutivelmente o defensor dos valores culturais angolanos na diáspora, é a referência maior do Semba no estrangeiro. Filipe Mukenga, André Mingas (falecido e de feliz memória), Carlitos Vieira Dias e Valdemar Bastos (falecido e também de feliz memória), são referências obrigatórias da história recente da música popular angolana que têm tentado dar outra sonoridade ao Semba.
Clélia Sambo e Nila Borja, duas jovens cantoras, projectaram as suas carreiras interpretando interessantes temas no género Semba, talvez influenciadas pelos seus respectivos pais, no sentido de contribuírem para a preservação dos valores da cultura nacional. Bolinha no pé, canção interpretada no estilo Semba e que serviu de cartão de visitas de Nila Borja, constituiu por muitos anos a alegria da criançada angolana.
O grupo musical Semba Master’s, constituído por quatro angolanos em Portugal, soube aproveitar de forma inteligente os recursos técnicos à sua disposição, imprimindo ao Semba tonalidades agradáveis. Foi a banda musical angolana mais solicitada naquela época, nos anos 90, em Portugal, quer para efectuar acompanhamentos em espectáculos, quer para servir de suporte instrumental em obras discográficas de diversos cantores.
In: “O Percurso Histórico da Música Urbana Luandense – subsídios para a história da música angolana” de José Weza. Compilação de Domingos Kinguari